sexta-feira, 6 de maio de 2011

ibirapuera

Carolina e Thiago se encontraram às duas da tarde em frente aos bloqueios da estação Brigadeiro, do metrô paulista. Quando se avistaram, ambos sorriram. Carolina era pequena, mas notável, com longos cabelos escuros e lisos. Thiago era sujeito boa-praça, bem quisto por todos os que o conheciam, e isso convencia Carolina de que ele era o seu par ideal. Naquele dia, Thiago tinha preparado uma surpresa para ela, e ninguém sabia disso. E esse foi o seu erro crucial.
Quando desciam a Avenida Brigadeiro Luís Antônio, Thiago resolveu 'sondar' um possível desejo de sua amada. Ela, charmosa como sempre foi, resolveu pedir algumas dicas, para tentar entender o que significavam aquelas perguntas cheias de rodeios. Depois de alguns bons minutos conversando e tentando entender o que se passava pelas suas cabeças, Thiago começou a dar pistas de que havia uma surpresa para Carolina. Ela logo se animou, mas a curiosidade foi maior do que se imaginou. A ponto de fazê-la emburrar-lhe a face o fato de Thiago ter pedido com calma e um sorriso no rosto (levemente sínico), dizendo que não haveria graça se ele contasse. Muito a contragosto, Carolina aceitou a condição de aguardar mais tempo para descobrir do que se tratava.
Passados alguns minutos após o princípio do desentendimento, Thiago a propôs um noivado sério, e a chance de se tornarem marido e mulher. Carolina surpreendeu-se a si mesma quando abriu um sorriso largo de orelha à orelha, afinal, ela não esperava aquilo justamente naquela hora. Carolina não tinha boa índole, e havia marcado encontro com outro rapaz logo após o primeiro encontro. Aquilo mexera com sua capacidade de ser tão fria a este ponto. Encabulada com este sentimento, resolveu contar toda a verdade à Thiago antes que fosse tarde demais, mas não adiantou muito. Thiago ficou estático com a verdade escancarada. Ficou sem chão, e até derramou uma lágrima. Carolina abaixou a cabeça, e chorou. Thiago levantou, andou alguns passos, e a chamou pelo nome. Ele jogou com um desdém cheio de desânimo, a caixinha aonde se encontravam as alianças com seus nomes cravados. Carolina percebeu o desespero daquele momento, e tentou o beijar. Thiago teve asco dela naquele momento. Voltou, apanhou a caixinha com as alianças, retirou a que tinha seu nome e jogou no lago onde os patos descançavam tranquilamente. Era um dia lindo, apesar do sol, não fazia um tempo abafado. Thiago andava sozinho, tentando fugir dos pulos de Carolina em direção à sua boca. Ele já não tinha vergonha de chorar a sua decepção. Carolina foi vencida pelo cansaço, e desistiu de tentar convencê-lo do contrário; de que poderia mudar e viver uma vida séria e comprometida. Naquela noite, Carolina trancou-se em seu quarto, e ligou inúmeras vezes para Thiago, e este por sua vez, não a atendeu em nenhuma das ocasiões. Thiago chorava todos os dias, e começou a ter aversão a tudo aquilo que ele havia vivido. Carolina, por sua vez, ficou amarga por ter cometido tantos erros contumázes com uma pessoa que sempre lhe demonstrou amor, carinho e respeito.
Passadas duas semanas, os dois cometeram suicídio. Namoraram 7 anos, e quando houve a iniciativa do casamento, descobriu-se que nenhum dos dois realmente se conhecia.

requiém de um mendigo

deito e sonho
durante um longo tempo
em querer mais conforto
mas eu estou morto
e todos me velam nesse momento

deitado, eu sonho
em querer mais um longo tempo
e durante ele, mais conforto
mas meu ser é um horto
nada se ouve além do vento

no meu sonho,
eu desejo apenas um alento,
um carinho ou um consolo
mas prefiro não abrir o olho,
a indiferença não sofreu renovo.

a penúltima estação

eu não escrevo o que vivo,
mas vivo escrevendo
não escrevo o que sinto,
não sinto o que penso

quem me dera se pudesse ser mais polido

hoje eu já não minto,
hoje eu até entendo
que o viver infinito
é apenas mais um complemento

mas viver com um vazio em si é horrível

o trem, quando sai da penúltima estação,
se arrasta por árvores e por entre a cerração
a minha mente, quando te imagina em vão,
esquece que, em mim, ainda há coração

e eu não direi verdades inteiras.